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Propósito

O velho é novo

By 7 de maio de 2019 junho 9th, 2021 No Comments

 

De repente, assisto os mesmos filmes que meu estagiário
 
por Marco Kato
Imagem: Netflix
 
Nosso tempo mudou. Ou melhor, está em constante mudança. Sempre foi assim, é verdade. Porém, podemos dizer que atualmente tais mudanças tem acontecido de forma mais rápida e profunda. Novas tecnologias, produtos e serviços impactam nas formas de interação social e de consumo. Também provocam mudanças econômicas e nas relações de trabalho e consumo.
 
Lidar com tanta informação e novidade gera ansiedade, insegurança e medo. O que virá depois? O que vai acontecer? Neste cenário, estudiosos teorizam que a nostalgia funciona como uma válvula de escape e defesa frente aos desafios de um mundo atual. Ou mesmo das intempéries da vida adulta.
 
“Millenials estão crescendo em uma época de turbulência econômica – um mercado de trabalho cada vez mais difícil,” segundo Cassandra McIntosh, analista senior de insights na Exponetial. “Logo, eles acabam romantizando e valorizando outros tempos mais simples – mesmo que eles nem os tenham vivido.”
 
Liderando um grupo de estudos sobre Nostalgia na Universidade de Southhampton, Inglaterra, Professor Constantine Sedikides, criou uma escala de Nostalgia (https://www.southampton.ac.uk/nostalgia/the-southampton-nostalgia-scale.page) e afirma que este sentimento pode ser trabalhado de forma positiva e nos ajudar a lidar com transições e mudanças. Também há estudos que avaliam o ‘Efeito Nostalgia’ deixa as pessoas propensas a consumir e gastar mais. Em artigo publicado no ‘Journal of Consumer Research’, Janine Lasaleta, Kathleen Vohs e Constantine Sedikides afirmam que há um enfraquecimento no desejo por dinheiro e, como conseqüência, as pessoas ficam mais abertas a fazer compras.
 
Logo, não é surpresa notar que umas das maiores e mais lucrativas franquias do cinema (e jogos, roupas, brinquedos, memorabilia, convenções, eventos) é de uma história espacial dos anos 1970. Por aqui, Sandy e Junior tem ingressos esgotados para sua turnê de ‘retorno’. A Brahma anuncia uma campanha na qual seus consumidores ‘revivem’ momentos passados ao refazerem fotos antigas.
 
De forma simplificada podemos afirmar que:
• Romantizamos o passado, uma vez que não temos controle do presente ou futuro;
• Selecionamos tendenciosamente as memórias e nossa visão pessoal deste passado;
• Temos o sentimento de reconexão com ancestrais, tradições e família;
• O sentimento é reconfortante, temos a sensação de pertencimento e resgate a algo que era melhor que hoje;
• Nos associamos a marcas e produtos que fazem parte desta busca e retorno nostálgico.
 
Por outro lado, é necessário refletir que, mergulhar de cabeça na onda nostálgica pode ser escapismo, uma fuga da realidade atual, que pode ter como consequência um imobilismo, ou mesmo retrocesso, uma vez que questões e anseios contemporâneos não são atendidos ou resolvidos. Assim, pode haver pouca investigação e busca de novas e interessantes soluções futuras.
 
Em seu livro Speculative Design (MIT Press), Anthony Dunne e Fiona Raby afirmam que ao contrário das leituras de tendências para designar respostas e soluções, e assim fazer ‘previsões’ e futurologia, o processo visa provocar o debate e a discussão sobre possíveis caminhos de futuro que as pessoas querem, ou não. A ideia é refletir sobre o impacto e implicações sociais, culturais e éticas das tecnologias em nossas vidas. Mas do que formular respostas, o intento é provocar perguntas: ‘What if?’
 
Na mesma linha em sua palestra no SXSW deste ano, Mick Champayne e Casey Hudetz estendem a discussão a partir do paralelo com a série ‘BlackMirror’, que, a seu modo, também apresenta possíveis realidades, algumas vezes distópicas, resultantes de nossa crescente imersão e envolvimento com as tecnologias.
 
O ponto interessante é que, ao questionarmos o presente e avaliarmos possíveis implicações, fugindo que uma mera resposta a um problema atual, podemos tomar melhores decisões baseados em tais suposições.
Há uma sensível mudança no papel dos designers e estrategistas, de ‘problem solvers’, para ‘future inquirers’.
 
Conclusão: o passado parece repleto de boas referências e um local ideal para nos reconfortamos e garantirmos a sensação de bem estar. Para explorar esta onda nostálgica a marca precisa ser autêntica e estar verdadeiramente presente e conectada com este sentimento. Uma história forjada não resiste muito tempo (vide DoBem e Diletto). Significa que não podemos nos alienar de compromissos e verdades atuais, apenas para referenciar um passado onírico. É importante perceber que da mesma forma que Gil Pender, personagem de Owen Wilson no filme ‘Meia Noite em Paris’ de Woody Allen, cada época tem suas dificuldades e desafios, assim como nosso atual presente. Identificá-los e vivenciá-los em sua plenitude nos ajuda a construir a possibilidade de um futuro mais desejável e otimista.
Marco Kato

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